sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Parte II

O Poder de (Des)Informar

Essa parte do livro trata do poder do boato, da incompetência na apuração, das declarações em off e da capacitação de fontes no desenvolvimento de conteúdo jornalístico.


Capítulo 1: O espaço da incompetência – Pg 57

Diálogo entre dois amigos, um da Folha de S.Paulo e outro do O Estado de S.Paulo, a respeito do caso do tubarão de Cananéia, noticiado em 10 de Dezembro de 1992.

Na Folha (leitor A): o tubarão era fêmea, estava grávida, media 5 metros de comprimento, pesava cerca de 2 toneladas.

No Estado (leitor B): o tubarão também era fêmea e estava grávida, mas media 7 metros de comprimento e pesava 2 toneladas e meia.


Pg 58

A verdade sobre o caso: o tubarão media 5 metros e trinta centímetros, pesava duas toneladas e meia, era fêmea, mas não estava grávida.

Para medir tubarões existem técnicas específicas. Um leigo é incapaz de avaliar com precisão o comprimento de um tubarão de grande porte. Ora, se o comprimento do tubarão capturado era a informação mais importante (gerou o título da notícia nos dois jornais concorrentes), os repórteres (...) em vez de usarem o próprio olhômetro ou as estimativas dos pescadores, deveriam ter obtido o dado exato junto aos especialistas da (...), que no dia estavam em Cananéia. Os pesquisadores (...) estavam , acessíveis aos jornalistas. Mas, no dia seguinte, os jornais publicaram informações incorretas e contraditórias, colhidas de fontes não citadas ou inadequadas, e impingidas aos leitores como confiáveis”.

“Os jornalistas foram apressados: (...) quando íamos de Santos para Cananéia, cruzamos com equipes da televisão que estavam voltando”.



Pg 59

“No estômago havia no estômago havia quatro cabeças de tubarões adultos, e pedaços de outro peixe e de um mamífero marinho. (...) uma das quatro cabeças encontradas no estômago pertencia a um tubarão de provavelmente 60 quilos. (...) em determinadas fases, acumulam (...) por isso ela parecia grávida”.

“Aconteceu, portanto, uma trapalhada jornalística (...) jamais souberam a verdadeira razão da falsa gravidez”.

“Os leitores (...) deixaram de ser informados sobre a alta significação científica do achado (...) informações que interessam aos centros de pesquisa especializada em todo o mundo”.

Como a pressa não é desculpa aceitável para imprecisões informativas (...) com que Cremilda Medina compõe o perfil ideal (...) a pauta foi mal cuidada, carente de ambições (...) captura do tubarão iria proporcionar”.



Pg 60

“A Veja (...) aproveitou as primeiras informações dos jornais, sem as checar. (...) 60 quilos no estômago”.

“A irrelevância política, cultural e econômica do acontecimento (...) remete a explicação dessa exibição de mau jornalismo para o campo da incompetência, aquele tipo de incompetência que se preocupa, apenas, com a ressonância dos títulos e as inexplicáveis vaidades da mediocridade”.

“O livre exercício do poder da incompetência condenou os leitores à informação deformada e incompleta”.



Capítulo
2 - A Força do Boato – Pg 61


Pg 61

Fortemente influenciado pelos interesses das fontes, intervenientes preparados (...) para usar (...) os meios e processos jornalísticos”.


Pg 62

Rumor, para a Folha de S.Paulo, é uma notícia que corre, verdadeira ou não. De acordo com o Novo Manual de Redação (...) esse tipo de informação se publica com o devido registro do que se trata de notícia não confirmada e desde que seja informação com indícios de relevância e não haja tempo de confirmar a exatidão dos dados”.

O velho boato

Pg 63

“O trânsito conceitual entre rumor e boato não agrada à Folha (...) Na origem latina ela significa “mugido ou berro de boi” (...) relaciona-se com a atualidade, fazendo circular informações que interferem nela”.

Pg 64

Boato: notícia anônima que corre publicamente, sem confirmação. Rumor é apenas um ruído, murmúrio de vozes, burburinho, efeito físico, pois. A carga de ambigüidade lhe dá, também, significado de notícia, informação, fama”.

“O boato motiva pautas, esconde ou expõe fatos, amplia ou reduz a dimensão dos acontecimentos, altera-lhes o significado, atrai ou repele a curiosidade dos repórteres, motiva ou inibe perguntas, direciona reportagens, gera ou elimina manchetes, produz desmentidos ou confirmações – e ao provocar tais efeitos (...) pode determinar ou modificar as intenções das mensagens jornalísticas, adequando-as aos interesses a que está vinculado”.

Ferramenta especializada das fontes, o boato circula em todas as áreas de interesse jornalístico, em especial na política, nos negócios e no mundo das estrelas. As próprias redações (...) azeitam esquemas nunca revelados para captar boatos em nichos bem situados nos vários centros de poder”.

“O off é a mais nobre e corriqueira prática do boato.”.

“O off é uma das almas da cultura jornalística”.

“O Estado de S.Paulo recomenda cuidados na utilização do off (...) se convier que não apareça no noticiário”.

“A Folha chega a exagerar. (...) para nortear o trabalho jornalístico”.


Pg 65

Kapferer: “Antes de existir a escrita (...) cada um passou a ter o seu território de propagação”.

Quem primeiro pesquisou o tema foram os americanos (...) Guerra Mundial”.

Allport e Postam: “o boato é uma proposição ligada aos acontecimentos do dia, destinada a ser acreditada, transmitida (...) a sua exatidão”.

Knapp: “uma declaração destinada (...) confirmação oficial”.

Peterson e Gist: “uma apreciação (...) de interesse público”.

“Na síntese, dois atributos principais caracterizam o boato (...) seja falso ou verdadeiro”.

Kapferer: “O boato exprime (...) parte da informação e dos media”.


Pg 66

Para Kapferer, ao atingir (...) torna-se informação falsa”.


Capítulo 4: A “arbitragem” nas redações – Pg 74

Duas notícias de ambos os jornais, com títulos e enfoques diferentes, a respeito de Roberto Pupo Moreno elogiando/criticando Interlagos.

O Estado: deu enfoque a crítica (no título), mas falou da tal crítica no segundo parágrafo.

A Folha: lead com elogios de Moreno.


Pg 75

“As observações feitas para a versão de O Estado devem ser (...) e quem decidiu que fosse assim?”.

Qualquer leitor mais crítico que tivesse lido os dois jornais (...) igualmente com a parcela de poder suficiente, produziu o título elogioso”.

Duas notícias sobre o reveillon organizado pela Administração Regional de Pinheiros, na av. Henrique Shaumann, na passagem de ano de 1991 para 1992.

O Estado: “Reveillon lota rua em Pinheiros”, assunto principal da página 2 do caderno Cidades.

Em subtítulo, informação que atribuía significado cultural ao acontecimento, e outra sugerindo idéia de sucesso, relatando uma festa alegre, descontraída e com elevado nível de participação popular.

A Folha: “Reveillon de rua em SP vira festa petista” na chamada da primeira página e o título na página 2 de Cotidiano “Erundina faz Reveillon eleitoral em Pinheiros”.


Fazer e Impedir

Pg 77

“Diz Marc Paillet que nenhum jornalista tem contato direto e permanente com os fatos. “Ele se dirige, portanto, aos informantes, de primeira ou segunda mão: as fontes”. E é precisamente que se produz o acontecimento essencial do fenômeno informativo estudado por Paillet – o abismo que separa o relato jornalístico da realidade dos fatos”.

Pg 79

Pertence à competência do jornalista transformar o acontecimento em notícia. Como defende Albertos, o fato se transforma em notícia desde que “haja sido recolhido, interpretado e valorado pelos sujeitos promotores que controlam o meio utilizado para a difusão”.

“Nas camadas superiores estão aqueles a quem Paillet chama de árbitros (diretores, editores, pauteiros, editorialistas, chefes de reportagem e até repórteres com prestígio pessoal), que decidem o que, quando e como publicar. Eles definem conteúdos, prioridades, relevâncias, enfoques, propósitos e a disposição final dos textos, a relação entre eles e a sua apresentação”.

Sem o poder de decisão final, mas com a capacidade atribuída de fazer notícias, existem as camadas “proletárias”, formadas pelos diferentes níveis de profissionais colhedores das informações, em contato direto ou indireto com os autores, atores e intérpretes dos acontecimentos. São os árbitros, porém, que decidem o essencial, interferindo em dois momentos fundamentais (...). Aos árbitros pertence, ainda, o poder da “última olhada no pacote de mensagens” a ser enviado ao público, depois que as informações escolhidas recebem o tratamento técnico de acabamento, por parte de secretários de redação (...)”.

“Essa capacidade de decidir o que informar e como informar resulta no exercício diário de um poder concreto. Como ensina (...) a teoria “é uma prática”.


E o Leitor?

Pg 80

“Pode-se não saber ao certo quem detém o poder. Mas sabe-se muito bem quem não o possui”.

Pg 81

“O leitor, por exemplo, raramente consegue interferir em conteúdos e intenções. Embora nos discursos de marketing dos jornais o leitor seja a razão central dos objetivos jornalísticos, na prática ele recebe tratamento de consumidor”.

“Na Folha, o manual em vigor (...) tem dois verbetes sobre o leitor.”

*
Mandato do leitor*

*Outro verbete*

“No Manual de Redação e Estilo de O Estado de S.Paulo, o leitor nem verbete merece. Para compensar, há uma referência logo no primeiro item (...) não ser justoexigir que o leitor faça complicados exercícios mentais para compreender a matéria”.


Pg 82

“O que prevalece na definição do espaço do leitor, por parte dos dois jornais, é a visão utilitária da empresa editora, para a qual o jornal é um produto, e como tal se deve relacionar com o mercado”.

Em nenhum momento se capta, na leitura dos manuais de redação dos dois jornais, qualquer preocupação ou reflexão mais sociológica ou cultural que trate o leitor como sujeito de um processo de comunicação e cidadão com direitos específicos”.

*Artigo 19 da Declaração Universal de Direitos*

“A liberdade de informação (...) refere-se tanto à possibilidade de difundir quanto ao direito de receber informações. Quando um jornal ou um jornalista subtrai a verdade ao leitor, ou o ilude com artifícios ou falsas intenções, o direito à liberdade de informação está sendo vilipendiado”.

“A universalidade do direito consagrado pelo artigo 19 (...) é tão grande quanto a própria Declaração, como assinala Desantes. E ele fala de uma discriminação social evidente: a das multidões que não podem interferir nem ter acesso aos meios informativos, por estarem esses meios nas mãos de oligopólios, controladores da informação”.

“O direito à informação é privilégio do leitor, não do jornalista nem dos jornais”.

Sempre que um editor ou um repórterpor incompetência, arrogância, interesse pessoal, ambição de poder, irresponsabilidade profissional, subalternidade a quem o controla ou qualquer outro motivo – priva o leitor da notícia correta e plena, trai o principal e mais belo dos compromissos que tem com a construção e o aperfeiçoamento de uma sociedade livre: assegurar a “todo indivíduo” o direito de ser informado. Com o relato veraz”.

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